Cadê a música?

Inspirado no post “...que a música me perdoe”, no blog O rio corre para o mar.

Stella Junia, a dona soberana do blog citado acima, quando fala de música é bom que todos fiquem calados. Ela tem muita moral para alertar sobre banalização da música, de sua transformação em produto de qualidade duvidosa e da falta de cuidado com tão bela expressão.

Impulsionado pela leitura “stellar” e por mera observação, vou tocar no assunto mais de outro ponto de vista. Aliás, pela falta de vista. Não vejo mais lugares onde se apresentavam os grupos instrumentais no Rio. Tirando uma ou outra casa que funcionam quase à margem da vida cultural carioca. Nelas ainda se apresentam músicos de primeira linha, alguns foram ícones da música instrumental brasileira nos anos 1980 e 1990. Conversando com um amigo contrabaixista profissional, tive a impressão que os músicos cariocas quase se estapeiam para tocar nesses lugares. Muitos migram para São Paulo, outros para fora do país mesmo.

Muita gente acha que música instrumental é musica de nicho. Eu também acho. Mas ela é essencial para o aprendizado e aprimoramento dos músicos. Seja executando, seja assistindo. Os músicos precisam ver outros músicos tocando. É essencial. Daí um dos motivos da pobreza musical. A música tem dinâmica, pausas e silêncios e a assimilação desses elementos é mais efetiva de forma presencial. Logo, se isso não é visto não é aprendido em sua totalidade.

A cena musical do Rio está paupérrima. A Lapa voltou a ser lugar de moda porque toca um samba de consumo para classe média descolada. Os clubes de jazz e os shows ao meio-dia e de fim de tarde no centro da cidade não existem mais. As rádios em sua maioria são compradas pelo jabá do pelo pagode dos mal amados e pela gritaria sertaneja. Ou então dominadas pelos barões do famigerado funk das favelas, deixando de ser veículos de informação do que é vanguarda. A música clássica ou é executada com excelência pelas grandes orquestras para um público reduzido, ou é mal tocada por conjuntos formados por estudantes de escolas comunitárias. É dose.

Em tempos em que tudo no Rio é olímpico, joga-se fora a história do Rio musical, casa de Tom Jobim, de Villa-Lobos, Pixinguinha, Noel Rosa, Cartola e tantos outros. Denúncia: estão matando a música carioca de inanição.

Comentários

  1. É isso aí, meu caro zero!

    Escrevo de Campinas e não me surpreende o fato de que esta cidade estar em paralelo ao Rio e a tantas outras aqui no Brasil. São Paulo talvez ainda saia de raspão dessa incômoda situação.

    Quando decidi ir para o seminário fazer o curso de música, saí de uma cidade americanóide: Manaus. Lá o negócio era beeem pior do que hoje. Mas ela ainda caminha a passos curtos, quase médios, em direção à musicalização de qualidade. Sim, a cultura tem sido grandemente incentivada pelo governo do Estado, como nunca havia sido antes e, graças a isto, o povo amazonense tem provado de uma culturização outra, que não a sua tipicamente folclórica (aliás, bem forte!).

    Pois bem, saí americanóide para iniciar -- sem parar jamais -- um processo individual de brasileirização musical. Descobri que o que os músicos brasileiros clamam é por espaço. E esse espaço ora existe, ora não existe. É engraçada esta oscilação. Porque infelizmente no Brasil é assim. A cultura musical oscila muito porque depende de poucos e não da massa. E a turba ensandecida não pensa. Aí entra o perigo: o que se passa à massa? O que você citou acima, das gritarias funk-sertanejas às execuções de alguma qualidade que a curto prazo hão de assustar o público ao invés de ensiná-lo a desenvolver a apreciação. Mas é o que vende. Se músico bom faz ao vivo, o ao vivo que vale é o espaço que existe nos programas televisivos de sábado e domingo.

    Se há quem se estapeie por tocar ou ouvir música de qualidade é porque o espaço tornou-se reduto, meio que taberneiro. Quem já nasce em berço espleêndido e não precisa se esforçar muito pra sentir e ver o que há de boa música talvez não entenda de imediato o valor que se agrega quando se o conquista. Mas não nos conformemos com isso, as batatas, se vencemos essa batalha, que não é vã. A luta deve continuar, mesmo sob a égide do pequeno passo aqui, mas grande para a humanidade lá. Meio chavão, mas a vida deixou de ser novidade há algum tempo...

    Abraço! Seu blog está à direita, Sr. Zero!

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  2. Reginaldo Macêdo de Almeida20 de novembro de 2009 às 01:08

    Alexon, aproveitando o mote de tudo ser olímpico, não havia porque a mediocridade não ser olímpica também.

    Há duas legislaturas já convivemos com o cinismo e a mediocridade olímpicos. Já era hora desta tendência chegar à música também.

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