Bônus? Eu também quero o meu.

A notícia da semana, para mim, foi o Congresso Americano (isso mesmo, com maiúsculas) aprovar uma lei que taxa em 90% os bônus de executivos de empresas que receberam ajuda financeira do governo. Foi uma das lições mais agudas de como um país sério deve funcionar. Fazendo uma paródia com o nosso brasileiríssimo seqüestro relâmpago, podemos dizer que os políticos de Washington criaram o “resgate relâmpago”.

Esse episódio tem desdobramentos não só políticos, mas éticos. Os políticos são de fácil digestão, todo mundo percebe no primeiro momento. Em tese, a política deve ser exercida para o bem comum, em todas as instâncias. Eu cedo, você cede no próximo passo. Nós cedemos nisso, eles cedem naquilo. No final o bem comum é o maior beneficiado. Como disse antes, em tese. Nas terras de cá, sabemos que a coisa não é bem assim...

Quero atentar para os outros fatores que tal decisão atinge. Os éticos. Todo mundo fala que estamos passando por uma crise de confiança. Os economistas, empresários, políticos, jornalistas, todos fazem coro. “Crise de confiança”. Eu parei para pensar nessa expressão e cheguei à conclusão de que isso é muito pior do que parece. O pressuposto das relações é a confiança. Se o seu cachorro não confia em você, ele vai morder. Se você não confia no médico, não há tratamento. Sem confiança no seu cônjuge em potencial, é prudente que o casamento seja desmarcado. E assim vai. Se há uma crise de confiança é porque ninguém confia em ninguém. As relações estão ficando micadas em todas as esferas. Isso é fruto da oxidação de valores básicos. Daí o desrespeito ao próximo e ao meio-ambiente, a ganâncias por lucros fáceis a irresponsabilidade com os bens das famílias. As pessoas arriscaram tanto que estão perdendo coisas que deveriam ser seguras ­­― casas, empregos, saúde, paz.

A justificativa de pagamento de bônus foi um contrato assinado (antes da crise), que dava aos executivos o direito a bônus. O que é certo: cumprir um contrato que manda pagar bônus, ou não pagá-los por motivos óbvios, mas não explicitados em um documento? Ai entra o conceito do que é lícito e do que convém. Pelos termos legais, é lícito aos executivos receber tais premiações ― mesmo quem eles tenham destroçado uma das maiores seguradoras do mundo. Contudo, não convém receber a grana. A ética será avaliada ainda mais vezes nesse episódio. Ele não acabou com a decisão do Congresso (maiúsculo). Certamente, aconteceram batalhas judiciais em torno do pagamento ou não dos bônus.

Enquanto isso, assistiremos o congresso brasileiro (minúsculo) escamotear o pagamento de horas-extras a funcionários em recesso. Nessa, todos nós perdemos os nossos bônus.

Comentários

  1. Querido Alexon: Este Blog esta comecando muito bem. Ele e atual,inteligente e revelador do cronista ,que esta sendo revelado, a cada artigo.

    Parabens> Lidice

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