Toda a unanimidade é...

Eu tinha me prometido que não tocaria mais nesse assunto de envolvimentos de jogadores do Flamengo com o crime (organizado ou não). A promessa foi motivada por achar que o futebol deve ser analisado do ponto de vista dos resultados e dos fatos envolvendo os jogos e as instituições. Vou quebrá-la agora

Pausa para os fatos: o Flamengo foi campeão da Série A do Campeonato Brasileiro em 2009, ao passo que clubes que se julgam os guardiões da moral e dos bons costumes saíram da degola no apagar das luzes do campeonato.

Sigamos...

A galhofa que se faz do resultado das partidas, a brincadeira do dia seguinte é bacana. Mas o caso Bruno fez as pessoas perderem as estribeiras. Não bastasse o prejuízo à imagem do clube de maior torcida do país, há de se aturar gente que mistura um delinqüente formador de quadrilha — que, convenhamos, é um excelente goleiro — com a torcida do Flamengo. Verdades absolutas e instantâneas são perigosas. Mais ainda se formuladas sob os efeitos da paixão.

O crime choca, é claro. Lidar com as conseqüências é difícil. Como explicar aos pequenos que aquele cara que era o herói virou o amigo dos vilões ou um deles? Como fazer uma criança que gosta de futebol, que adora as cores de seu time não confundir fatos isolados com u a história de um clube? As respostas são Domingos da Guia, Evaristo Macedo, Zizinho, Leônidas da Silva, Carpegiani, Carlinhos, Rondinelli, Zico, Junior, Adílio, Julio César “Uri Geller”, Mozer, Andrade, Raul, Zé Carlos e Bebeto, Leandro tantos outros jogadores admiráveis. Até porque, ninguém sabia da índole de Bruno até o fato acontecer. Ouso dizer que todos os times cariocas gostariam de ter um goleiro com o desempenho dele debaixo das traves.

Eu adoro futebol. Se o futebol me amasse na mesma proporção, acho que teria sido um craque nas quatro linhas. Mas mesmo com esse amor desbalanceado, ele me permitiu ver coisas maravilhosas. Me dói quando torcidas brigam, destroem o patrimônio alheio ou público. Como o ocorrido com quatro vagões do metrô carioca na última quinta-feira, por um grupo de (pasmem!) tricolores. Como sei que este incidente é de exceção, obrigo-me a lembrar que taxar a torcida rubro-negra de “bando de pobres”, “favelados”, “mulambada”, “ladrões”, “analfabetos” e tantos outros elogios é de uma indelicadeza enorme. Explico.

Imaginemos se todos os subalternos da cidade do Rio de Janeiro fossem flamenguistas. Sendo assim, as babás, motoristas particulares, seguranças, porteiros, empregados domésticos, carregadores, entregadores, motoboys, ascensoristas e tantos mais seriam flamenguistas. Isso quer dizer que grande parte de das coisas que amamos estão sob a guarda destes “pobres”, “favelados”, “mulambada”, “ladrões”e “analfabetos”. Que perigo se está correndo! Ou seja, é tudo muito ridículo.

O mais admirável dos tricolores, Nelson Rodrigues, expressava sua birra com o Flamengo de outras formas. Algumas muito engraçadas, como o marido boa-praça e traído de Engraçadinha. Mas nunca partiu para essa coisa agressiva dos últimos tempos. Se estivesse vivo, talvez ele diria: “Vou falar de novo: Toda a unanimidade é burra.”

Comentários

  1. Alexon, é ÓBVIO que por ser a maior torcida do Brasil, absolutamente a torcida do Framengo reúne o melhor e o pior do Brasil e mais especificamente do Rio de Janeiro que qualquer outra torcida. E é ÓBVIO que ninguém se incomoda com o melhor e sim com o pior. Collateral Damage.

    Acontece que o futebol, que outrora foi um esporte que reunia algum valor, tornou-se hoje uma máquina de fazer dinheiro, regardless dos valores que transmita, e convenhamos: ultimamente o futebol não tem passado exatamente os valores que nós gostaríamos que os nossos filhos seguissem. Isso é um problema do futebol como um todo e do Framengo em particular por ter pelo menos 3 marginais conhecidos (Adriano, Bruno e Wagner Love). Digo conhecidos porque certamente há outros que nós não conhecemos em todos os outros times, vide a cara de paisagem com óculos de sol de Renato Gaúcho na entrevista ao Fantástico.

    O que nos cabe a todos, como torcedores (e pais-de-família) dos times que torcemos, vencedores ou perdedores, é exigir que o talento venha acompanhado de valores, para que os fins não justifiquem os meios.

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