Cristo não. Perimetral sim.

Imaginemos a seguinte situação hipotética:

Eduardo Pães decide instalar uma estátua gigante de Jesus Cristo no alto do Corcovado. Esta estátua seria um projeto realizado por uma parceria entre franceses a brasileiros e o desenho seria escolhido através de um concurso. 

Seria polêmica na certa. Rapidamente, apareceriam os "verdes", alegando que uma estátua aberta a visitação num dos pontos mais altos do Maciço da Tijuca seria uma violência ao ecossistema do local. Surgiriam também os ateus e não cristãos, reclamando que uma representação de Cristo não deveria ser paga com o dinheiro do estado, que é laico pela Constituição. Seriam discursos inflamados, passeatas, atos públicos. A internet estaria lotada de blogs, posts, artigos e movimentos nas redes sociais. 

Gente na rua, Black Block, gás de pimenta. "Fora Paes", "Fora Cabral", "Cadê Amarildo". "Com o dinheiro dessa estátua dá pra fazer x hospitais e y escolas."

Paes insiste e inaugura a estátua do "Cristo Redentor", com a presença (e a benção) de vários segmentos cristãos. Uma das pedras usadas é abençoada pelo papa Francisco. 

Os primeiros que visitam o monumento ficam maravilhados com a vista que se tem da cidade. Os compositores citam-no em suas composições. E o "Jesus gigante" vira atração turística das mais visitadas na cidade e um de seus símbolos. São miniaturas, camisas, desenhos e até tatuagens retratando o colosso de concreto. 

O tempo passa. Eduardo Pães e seus opositores envelhecem e morrem. Uns oitenta anos depois de sua inauguração, o Cristo Redentor é escolhido como uma das sete novas maravilhas do mundo. 

Todos os cariocas ficam orgulhosos pelo reconhecimento de seu "mascote" mais querido. 

Voltemos à realidade. 

No último domingo, parte importante da Perimetral foi demolida. A intenção é já acostumar a cidade com outros modos de chegar ao centro do Rio de Janeiro. Inclusive, usando outros modais de transporte. Será um transtorno, principalmente para os niteroienses que vêm de carro para o Rio. Além disso, tem um grande fluxo que vem da Avenida Brasil e da Linha Vermelha. É uma incógnita o que realmente acontecerá. Mas não há como fazer o omelete sem quebrar os ovos. 

Frase batida. Conceito esquecido. 

O que será da cidade, e principalmente do centro do Rio, depois do fim da Perimetral? Quais serão as soluções de transporte que serão adotadas no futuro? Elas serão efetivas? Em termos urbanísticos, teremos uma Região Portuária melhor? 

Não sabemos responder estas perguntas. Que sabemos ou são as projeções dos otimistas, ou as maldições dos pessimistas, ou os chutes dos achistas. O que temos é a certeza de que cidades vivas têm suas histórias permeadas de polêmicas, sejam elas comportamento, econômicas ou urbanísticas. Paes será e já é bastantes criticado. Muitos outros já foram e hoje seus atos que foram alvo de crítica são alvos de elogios. 

Não quero absolver o prefeito carioca, apesar de admirar sua coragem de mudar a vida dos cariocas de forma tão significativa. Para pior? Logo saberemos. Para melhor? Um distante futuro nos dirá.

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