CONTO Nº. 02
Era domingo.
Fria manhã. Ela acordou mais cedo que o usual. Sentiu-se estrangeira na própria cama, apesar do cenário batido. Fechou os olhos, na ilusão de que, ao abri-los novamente, tudo poderia mudar. Não mudou.
Ela ouvia a respiração profunda, pontuada, incômoda. Tudo se tornara incômodo. Não o reconhecia mais. Não se reconheciam mais. Ele era o homem que ela julgou que amaria para sempre. Não que ela tivesse deixado de amá-lo. Talvez, sim... Provavelmente. Mas era difícil aceitar. Já não havia mais o ânimo de antes, a vontade, o brilho. Não era a rotina, não eram problemas. Simplesmente não era. Mais nada.
Levantou. Pela fresta da persiana, ela notou as poucas gotas de chuva. Olhou para a cama e percebeu que se ela desaparecesse o sono dele não seria interrompido. Mudou a roupa, lavou o rosto, calçou um par de tênis. Foi à cozinha, bebeu água. Saiu. No espelho do elevador, via-se por inteiro. "Merda. Engordei.", pensou ela. Mesmo assim, enxergava-se bela. Como era bela! Térreo. Portaria. Rua.
Sentia no rosto gotas esfriadas pelo vento. A lagoa Rodrigo de Freitas era de céu baixo. Quase ninguém. Um deserto gris. Ela andava apressadamente, como se fugisse. Depois, corria como se tentasse alcançar algo. Respostas... Para tantas perguntas... Aquela falta de paciência? Aquela intolerância com o que sempre foi intolerável, mas que ela sempre aceitou? Por que ela? Justo ela? Ela sempre fez tudo certo? Certo? O que é certo?
A lagoa tem a forma de um coração com sete quilômetros e meio. Ela não se sentia cansada. Mas a alma estava exausta. Queria alívio, queria paz. Ela já sentira paz certa vez. Onde estaria essa paz? Voltou para casa. Tomou um banho, perfumou-se.
Fez café. Pôs a mesa. Deu "bom dia".
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