Uma carta para minha mãe
Oi, mãe.
Quanto tempo!
A teologia me ensinou a acreditar que não teríamos mais contatos até o dia do juízo final. Mas o meu amor e a minha saudade me fazem acreditar que, por muitas vezes, já tivemos alguma forma de contato. Que digam os sonhos tão reais que tive com você... até o seu perfume eu senti.
Por aqui, muita coisa acontecendo, mãe. Desde que você se foi, muita coisa mudou e muitas continuaram a mesma coisa, só que com nomes e personagens diferentes. As pessoas que você julgava não serem legais mostraram a que vieram. Quem você apostava todas as fichas provou que você estava certa. Decepções, algumas. A gente não acerta sempre. Lembra da última brincadeira que fizemos? Você disse que estava enjoada de marmanjos e que queria um neto. Ele veio, ou melhor, ela. Uma menina, linda, esperta, cheia de perguntas difíceis pra gente responder. Ela é a minha cara, magrinha como eu era na idade dela. Tem cachos dourados que reluzem à luz do sol. Vaidosa e adora dançar. Um dia desses ela me perguntou se quando ela virar anjo, ela vai te conhecer...
Sinto sua falta, mãe. A vida é boa, mas não é fácil, sou um sujeito feliz. Mas nem por isso estou livre de revezes. Depois do fim do casamento, o recomeço é sempre complicado. Eu tenho me refeito aos poucos, já andei muito e sei que ainda tem muito o que andar. Digamos que quando olho para trás me surpreendo com o que já caminhei. Sinto-me mais leve, mais inteiro, apesar das perdas. Me olho no espelho e vejo a mim mesmo. É uma reconquista. Já deu até para me apaixonar novamente. Mas, como você me conhece bem, sabe que não vou entrar em detalhes nesse assunto. Estou com bem menos cabelos... e eles estão ficando grisalhos. Em compensação, tenho me alimentado bem e estou com a saúde em dia. Há 8 anos comecei a participar de corridas de rua e me apaixonei pelo esporte. Fiz amigos, e até de maratonas eu participo. Sempre lembro de você quando vejo aquelas senhoras animadas, batendo palmas nos percursos.
Estou escrevendo porque tem dias que a saudade bate forte. Acho que por conta da proximidade do dia das mães, eu fiquei mais sensível. É no próximo domingo, tudo que eu queria era poder encontrar você, deitar no seu colo por alguns instantes e me sentir em casa. A gente cresce, vê e experimenta muita coisa, mas sempre quer ter o carinho da mãe por perto. Ainda sinto cheiro da sua comida, ainda ouço você cantando os hinos do Cantor Cristão e as músicas da Dolores Duran e da Maysa pela casa. Até de seus exageros eu sinto saudades.
Como disse antes, a teologia que me foi ensinada não me permite achar que essa carta vai chegar a você. Mas a sua falta e o amor que tenho por você são tão grandes, que eu estou dando um tempo com essa teologia. Sendo assim, resolvi mandar notícias.
Te amo muito mãe!
Um beijo,
Seu filho.
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