Etiquetas na testa

Na última quarta-feira, participei de uma atividade que discutia sobre rótulos. Era basicamente assim: colocava-se uma etiqueta na testa das pessoas com uma característica que poderia ser ou não condizente com ela. As demais pessoas deveriam tratar umas as outras de acordo com o que estava escrito na etiqueta. Notadamente, algumas pessoas portaram etiquetas (e, conseqüentemente, rótulos de personalidade) muito diferentes do que realmente eram. Isso gerou uma discussão muito rica. Contudo, fica sempre a reflexão que fazemos sozinhos depois que a atividade acaba. Eu, por exemplo, fiquei pensando nos rótulos que me foram impostos e nos que eu mesmo os impus a mim. Rótulo é uma síntese, uma redução — e como tal corre o risco de ser erronia.

Rotulamos as pessoas ou grupos sociais e, via de regra, não damos espaço para alterações destes rótulos ou para a agregação de outras características. Depois de rotularmos, esperamos um comportamento e um estereótipo determinado. Assim, o rotulado é acondicionado num espaço reduzido de percepções e ações, sem direito a variações.

O pior de tudo é o auto-rótulo. Ele pode ser adotado por uma pessoa ou por um grupo de indivíduos com similaridades. Exemplifico com a seguinte situação em que me vi posto no dia seguinte ao da citada atividade. Tive um compromisso fora do escritório e quando voltei para o prédio onde trabalho já passava das 19h. A escala da segurança tinha mudado e o guarda de plantão era diferente dos que costumam estar quando transito pelo prédio. Ao entrar no prédio, o tal guarda me perguntou: “Você é motorista de alguém?” (eu usava terno). Confesso, senti raiva misturada com surpresa. Afinal, ali era meu local de trabalho, estou lá todos os dias. Só respondi um lacônico “não”. O elevador chegou, não deu tempo de falar mais nada. Onde está o auto-rótulo? O segurança é negro (eu idem). Sendo assim, o auto-rotulo assumido pelos negros (no Brasil) é o de que nada além dos trabalhos subalternos lhe são destinados. É triste perceber que ao se olhar no espelho, alguns (ou muitos, neste caso) possuem uma visão depreciada de si mesmos.

Os rótulos (graças a Deus) caem. Mas esse trabalho em sua maior parte é de quem os possui. O primeiro movimento deve ser sempre do rotulado. Rotulado, até que se prove o contrário. Se o rótulo é ruim, ele vira uma espécie de tarja preta, igual a dos remédios psiquiátrico de alto controle. Diante disso, o meu conselho aos vitimados pelos maus rótulos é que eles tratem de retirar as etiquetas de suas testas.

Quais são seus rótulos?

Comentários

  1. Quantos rótulos equivocados são colados em nossa testa...

    Cris

    ResponderExcluir
  2. Eu confesso que, como funcionário público, judeu, gordo e gay (não necessariamente nesta ordem), já me acostumei com rótulos. A questão é deixar ou não que tais etiquetas estereotipadas sejam coladas nas nossas testas. As minhas, por ter uma pele muito oleosa, não colam mais. [:)]

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Atenção: Acusações insultuosas, palavrões e comentários em desacordo com o tema da notícia não serão publicados e seus autores poderão ter o envio de comentários bloqueado neste blog.
Pense antes de escrever. Assine depois de escrever

Postagens mais visitadas deste blog

Crocodilo falante

I Dreamed A Dream

Maio e Miles (Capítulo 4): Kind of Blue